sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

O MONGE DAS ÁGUAS SANTAS


Dificilmente pesquisadores têm a felicidade de atestar com segurança quando nasceram certas lendas e mitos. Para minha alegria, foi possível encontrar a “certidão de batismo” do Monge João Maria, o santo popular mais reverenciado de todo o sul do Brasil. Com relativa abundância de documentos, consegui ver quando o eremita italiano Giovanni Maria de Agostini se tornou o MONGE MILAGROSO DO RIO GRANDE. Isto teve data e local precisos: entre o final de 1846 e início de 1848 nos arredores da pequena vila de Santa Maria da Boca do Monge.

Após tentativas frustradas de catequizar índios Charruas no interior do Uruguai e um tempo detido no palácio do governador de Buenos Aires, Juan Manoel de Rosas (ver entrevista sobre esta experiência platina do eremita italiano em Presença de João Maria na Argentina de Rosas), Agostini voltou para o Rio Grande do Sul no final de 1846. Estabeleceu moradia próxima à vila de Santa Maria. Deixemos que fale o próprio eremita:

"Em 1846, quando eu tinha 45 anos de idade, dirigi-me para um retiro solitário no Campestre, onde permaneci por onze meses, andando até Santa Maria de La Boca del Monte. Neste vasto deserto inculto descobri uma fonte de água mineral com maravilhosas propriedades curativas, e o lugar que era refúgio de tigres e leões tornou-se uma próspera vila". (Livro de memórias do eremita Juan Maria de Agostini. WOLFE, Charles. New Mexico´s Hermit. San Miguel News. Volume 2, Fevereiro de 1925).

Devido a esta descoberta, milhares de pessoas, de todas as partes do Rio Grande do Sul, do Paraguai, do Uruguai, das províncias argentinas de Corrientes e Entre-Rios, e até de São Paulo e do Rio de Janeiro, dirigiram seus passos ao Campestre das Águas Santas na esperança de alcançar a cura das enfermidades. E não pensemos que somente pessoas pobres, “desenganadas” pelos médicos, “ignorantes” ou “supersticiosos” (segundo termos da época) foram até o local, antes o contrário. Ex-combatentes da Guerra dos Farrapos, um ex-governador da província de Corrientes, ricos comerciantes de Santa Maria, uma aclamada poetisa sul-rio-grandense que vivia na Corte, um pároco do interior de São Paulo, um ex-monge beneditino que residia em Passo Fundo, um representante do bispo fluminense (em 1848 o Rio Grande do Sul ainda pertencia à diocese do Rio de Janeiro), pessoas de destacada posição social, além de índios, mulatos, pardos, negros escravos ou alforriados foram até o local descoberto por um monge estrangeiro atrás dos benefícios das Águas Santas. Com tamanha repercussão, o eremita solitário abandonou o Campestre por não suportar aglomerações, mas prometeu que voltaria...


Desde o final de 1846, todos os caminhos levavam à Santa Maria da Boca do Monte (sob a sigla SMBM, no centro do mapa) ou, mais especificamente, ao Cerro do Campestre. Neste local o eremita João Maria de Agostini descobriu uma fonte de água com propriedades medicinais para uns, milagrosas para outros (Mapa do Rio Grande do Sul, entre 1838 e 1848. Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia da UFRGS, Gabinete de Cartografia, 1961).