quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

OS MILAGRES DAS ÁGUAS E O MARTÍRIO DO SANTO

A partir de maio de 1848, os jornais do Rio Grande do Sul começaram a dar cobertura a um "extraordinário" evento, publicando em suas páginas diversas notícias sobre os milagres da fonte descoberta por um monge estrangeiro. Durante meses deram voz aos devotos, divulgando o nome, o local de origem, a idade, em alguns casos a cor, as moléstias e quantos banhos eram necessários para que o doente se restabelecesse. Havia gente de todas as partes da província: Santa Maria, Cachoeira, Porto Alegre, Santa Bárbara, Caçapava, Camaquã, São Gabriel, Santana do Livramento, Lavras, Santo Antônio da Patrulha, Piratini, Taquari, etc.; bem como do Estado Oriental (Uruguai). A descrição era assim: “Rufino Teixeira de Andrade, branco, morador em Santa Bárbara, 22 anos. Sofria há 8 meses de uma afecção interna do lado direito. Chegou a 13 de maio, e no dia 16 estava perfeitamente bom.” Ou ainda: "Tenente Coronel João Gonçalves Padilha, 65 anos, morador na Boa-Vista, distrito de São Martinho. Incômodo do peito, grande tosse, e quase privação do andar, pelas dores nas coxas e pés. Está que não sente mais nada". As enfermidades eram variadas: asma, problemas nos olhos, ataques nervosos, inchação de pés e pernas, paralisias dos membros, reumatismos, fraturas e quebraduras, “facada no lado esquerdo abaixo do coração” que redundava em problemas respiratórios, cólicas, dores de estômago, inflamação no ventre, tonturas, feridas pelo corpo, “mal de São Lázaro” e “fístula em lugar perigoso sobre o ânus”. Vê-se que o local das Águas Santas, ou Fonte do Monge, atraía gente com diversos problemas de saúde.






Cão refrescando-se na Fonte do Monge, no Cerro do Campestre. Atualmente, a fonte não é mais procurada pelos devotos, pois a memória dos milagres cedeu espaço à Romaria de Santo Antão.





A quantidade de pessoas frequentando o lugar chamou a atenção não só de jornalistas, padres, médicos e políticos, mas também do presidente da província sul-rio-grandense, o general Franscisco José de Souza Soares de Andréa. A primeira atitude do presidente foi nomear um médico especialista capaz de investigar se as águas do Campestre eram de fato medicinais ou tudo não passava de "exagero" do povo. A segunda ação foi tentar conhecer o tal monge estrangeiro, saber suas intenções e para quem trabalhava. Para tanto, o general presidente ordenou que o trouxessem para fazer-lhe um interrogatório. Em outubro de 1848, João Maria de Agostini estava no Cerro do Botucaraí, vivendo como eremita, mas também evangelizando e tratando de doentes através de suas práticas de cura. No amanhacer do dia 17 de outubro, uma pequena escolta vinda de Rio Pardo dava ordem de prisão ao monge. Como testemunhas estavam milhares de devotos - muitos eram escravos fugidos que viviam em Quilombos nos matos da Serra Geral próximo ao Botucaraí - presenciando a captura do santo. Quase ocorreu uma tragédia, pois quiseram libertar o monge da mãos dos guardas. Agostini, contudo, tratou de acalmar a todos, aconselhando que o deixassem partir para o martírio, "a fim de voltar depois mais santo e mais milagroso".

 


Cerro do Botucaraí, local da prisão do monge Agostini, em 17 de outubro de 1848. Os habitantes do município de Candelária (RS) chamam-no de Cerro do Monge.

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